segunda-feira, 30 de março de 2015

A primeira vitória de Nelson Piquet

 © 1980 - Getty Images

Quando a temporada de 1980 começou, o Brasil vivia uma época de vacas magras na Fórmula 1. Desde a última vitória de Emerson Fittipaldi, na Inglaterra, em 1975, o país não via um piloto brasileiro no lugar mais alto do pódio. Em 1978, chegou perto, quando Emerson terminou em segundo no GP do Brasil, em Jacarepaguá, a bordo do Copersucar. Foi uma festa, mas tanto para a torcida quanto para grande parte da imprensa esportiva, infelizmente acostumadas a valorizar apenas as vitórias, isso não bastava.

Encerrada a temporada de 1979, o descrédito era total e o desinteresse pela Fórmula 1 era tão evidente na época que fez com que a Rede Globo deixasse de transmitir as corridas, entregando-as de bandeja para a TV Bandeirantes (acompanhe a íntegra da corrida no vídeo abaixo, com narração de Galvão Bueno em sua melhor fase e os comentários precisos do saudoso Giu Ferreira).

E foi assim que o Brasil teve, pela primeira vez, uma temporada sendo transmitida na íntegra para todo o país. Azar da Globo, sorte da Bandeirantes, pois justamente depois dessa transição a imagem do Brasil na Fórmula 1 começou a mudar.

Após as três primeiras etapas de 1980 - Argentina, África do Sul e Brasil -, Nelson Piquet, em quem a Brabham vinha apostando desde a saída de Niki Lauda, somava nove pontos e era o terceiro colocado no campeonato, atrás do líder René Arnoux, com 18 pontos, e de Alan Jones, com 16. Até então, este era o melhor resultado de um brasileiro na classificação geral, desde que começara o declínio de Emerson, em 1976.

Para a quarta etapa, a Fórmula 1 desembarcou em Long Beach, nos Estados Unidos. E foi ali que, na tarde de 30 de março, boa parte dos brasileiros voltou a demonstrar algum interesse pela categoria, reiniciando um hábito que, a partir daquele dia, se tornaria constante por mais 14 anos, até a morte de Ayrton Senna.


Piquet marcou a pole position - a primeira de sua carreira na Fórmula 1 -, com o tempo de 1min17s.694, botando quase um segundo de diferença em relação a Arnoux, com quem dividiu a primeira fila do grid. No domingo, um susto: durante o warm-up, Piquet e o irlandês Derek Daly, da Tyrrell, se envolveram em um acidente, fazendo com que a Brabham BT-49 do piloto brasileiro decolasse e caísse violentamente com as quatro rodas no chão, enquanto a Tyrrell seguiu em direção à área de escape. Mas nada de grave aconteceu e o carro de Piquet estava apto para ir à pista.

Na largada, Piquet saiu-se bem e, em poucas voltas, começou a abrir uma boa vantagem sobre o francês Patrick Depailler, da Alfa Romeo, passando a administrar a diferença em relação aos demais durante todo o restante da prova. Com isso, boa parte da emoção da corrida pôde ser vista no pelotão intermediário, onde ocorreu a maior parte das ultrapassagens e também alguns acidentes.

Entre os acidentes, o de maior gravidade acabou pondo um fim à carreira do suíço Clay Regazzoni. O piloto perdeu o controle de sua Ensign na 53ª volta, batendo violentamente contra o muro e ficando preso no cockpit por cerca de 20 minutos. No hospital, foram constatados ferimentos leves na cabeça, fraturas múltiplas na perna direita, lesão na coluna e suspeita de lesões internas. Dias depois, Regazzoni estaria condenado a passar o resto de sua vida em uma cadeira de rodas, até sua morte, em 2006, decorrente de um acidente de trânsito.

Nos momentos finais da prova, Piquet continuava abrindo a diferença em relação aos demais. Na volta 63, com o italiano Riccardo Patrese, da Arrows, na segunda colocação, a vantagem já era de 52 segundos. E a corrida prosseguiu assim, até a bandeirada final, depois de 80 voltas, com Piquet conquistando sua primeira vitória na Fórmula 1. Patrese permaneceu em segundo, com Emerson Fittipaldi completando o pódio, em terceiro, sendo esta a última participação do Fittipaldi F7 na categoria.

Nelson venceu de ponta a ponta, aproveitando também para estabelecer o novo recorde da pista, na volta 38, com o tempo de 1min19s83, quebrando a marca estabelecida por Gilles Villeneuve, em 1979. E de quebra, assumiu a liderança do campeonato, empatado em 18 pontos com Arnoux.

Naquele 30 de março, o Brasil colocou um fim a um jejum de quase cinco anos sem vitórias na Fórmula 1. E Nelson Piquet consolidava, a partir daquele dia, o início de sua bela carreira.

Pos Piloto País Equipe / Motor Diferença / Abandono Voltas
1  Nelson Piquet  Brabham / Ford - 80
2  Riccardo Patrese  Arrows / Ford  a 49.212s 80
3  Emerson Fittipaldi  Fittipaldi / Ford  a 1:18.563s 80
4  John Watson  McLaren / Ford  a 1 volta 79
5  Jody Scheckter  Ferrari / Ferrari  a 1 volta 79
6  Didier Pironi  Ligier / Ford  a 1 volta 79
7  Jochen Mass  Arrows / Ford  a 1 volta 79
8  Derek Daly  Tyrrell / Ford  a 1 volta 79
9  René Arnoux  Renault / Renault  a 2 voltas 78
10  Jean-Pierre Jabouille  Renault / Renault  a 9 voltas 71
-  Keke Rosberg  Fittipaldi / Ford  Superaquecimento 58
-  Clay Regazzoni  Ensign / Ford  Acidente 50
-  Bruno Giacomelli  Alfa Romeo / Alfa Romeo  Colisão 49
-  Alan Jones  Williams / Ford  Colisão 47
-  Gilles Villeneuve  Ferrari / Ferrari  Transmissão 46
-  Patrick Depailler  Alfa Romeo / Alfa Romeo  Suspensão 47
-  Jacques Laffite  Ligier / Ford  Furo no pneu 36
-  Eddie Cheever  Osella / Ford  Transmissão 11
-  Carlos Reutemann  Williams / Ford  Transmissão 3
-  Jean-Pierre Jarier  Tyrrell / Ford  Acidente 3
-  Elio de Angelis  Lotus / Ford  Acidente 3
-  Jan Lammers  ATS / Ford  Transmissão 0
-  Mario Andretti  Lotus / Ford  Acidente 0
-  Ricardo Zunino  Brabham / Ford  Acidente 0
NQ  Dave Kennedy  Shadow / Ford  Não se qualificou -
NQ  Geoff Lees  Shadow / Ford  Não se qualificou -
NQ  Stephen South  McLaren-Ford  Não se qualificou -
NP  Marc Surer  ATS / Ford  Não participou (ferido) -

4 comentários :

  1. cleito itamar bandeira vieira31 de março de 2015 às 15:57

    Vi
    a corrida na íntegra, tempos atrás. Além da vitória incontestável e
    segura do Nelsão, foi interessante a prova de recuperação do Emerson
    Fittipaldi, que naquele dia fechava o grid. Galgou posições com sua
    constância e com os problemas dos adversários.
    O pódio - com Piquet, Patrese e Fittipaldi, marcava a transição da
    década de 70 - em que Emerson foi campeão antes do desafio da Copersucar
    - para a de 80, em que surgia e se afirmava Nelson Piquet. Foi uma
    sucessão. Uma história a ser sempre eternizada, em combate a amnésia
    coletiva e a "idolatria do herói do momento".

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  2. Uma corrida daquela época remete, a meu ver, à Fórmula 1 que muita gente passou a admirar, com características que hoje em dia não se vê mais: pilotos com personalidade forte, capazes de soltar uma frase de efeito em uma entrevista, sem a preocupação exagerada com a imagem; carros com designs variados, fruto da liberdade que os projetistas tinham antigamente, sem o exagero de restrições do regulamento; layout interessantes (os carros eram bem mais bonitos naquela época); a saudosa coroa de louros usada nos pódios, e que era tão característica das corridas. A lista é imensa. Obrigado pelo comentário e apareça sempre que puder. :-)

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  3. cleito itamar bandeira vieira31 de março de 2015 às 16:42

    Eu que agradeço pelo espaço e todas as opiniões encontrarão concordâncias e discordâncias. Sobre as restrições de regulamentos, a Fórmula 1 (do chamado "velhinho tenebroso", Tio Benie) se transformou na "grande" projetista da atualidade. Com as restrições que ela impôs as criações dos projetistas, a Entidade que é o próprio Tio Bernie abortou o surgimento de Colins Chapmans, Patricks Heads, Adrian Neweys, enfim: engessou a criatividade. Que a era pós-Bernie e com Novo Pacto da Concórdia (o atual vence em 2019?) entre as equipes e a categoria tragam as mudanças carece.

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  4. Cara, que espetáculo! Eu era criança e me lembro que vi essa corrida com meu saudoso avô. Obrigado por sempre compartilhar essas relíquias conosco.

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