Sob forte chuva, Markus ficou conhecido naquele dia por ter liderado seis das 60 voltas da corrida, após uma troca antecipada dos pneus durante a volta de apresentação, o que lhe deu uma vantagem inusitada sobre os outros pilotos.
Markus é filho do falecido Manfred Winkelhock, que também correu na Fórmula 1 na primeira metade dos anos 80, assim como seu irmão, Joachim, que seguiu o mesmo caminho em 1989, pela AGS - nesse caso com bem menos sucesso, não se qualificando para nenhuma etapa daquela temporada.
Seu início nas pistas veio tarde, aos 18 anos, na Fórmula König. Em seguida, passou por diversas categorias, como F-Renault Alemã, F-Renault Eurocup, F3 Alemã, F3 Euroseries e também no DTM. Depois de um breve retorno aos monopostos em 2005, na World Series by Renault. Os bons resultados naquele ano - três vitórias e a terceira colocação no campeonato - lhe renderam o convite para ser piloto reserva da Midland em 2006. No ano seguinte, com a equipe já rebatizada como Spyker, Winkelhock aguardava sua chance, o que só veio a ocorrer na etapa de Nürburgring.
Na entrevista a seguir, ele conta os detalhes daquele dia, o início nas pistas e o que o sobrenome famoso representa em sua terra natal.
Disputando a F3 Alemã em Hockenheim |
Na verdade, eu só falei com a minha mãe depois de já ter tomado a decisão, em 1998. Com o restante da família eu nunca tinha comentado nada. Só o namorado da minha mãe sabia e foi ele quem me ajudou a conseguir meus primeiros patrocinadores. Mas no primeiro ano eu corri apenas para me divertir, pois não era a minha intensão seguir carreira no automobilismo. Naquela época, minha mãe, com certeza, não ficou contente e tentou de tudo para me convencer a desistir da ideia depois de tudo o que aconteceu.
Você chegou a pensar em seguir outra profissão ou é algo que nunca passou pela sua cabeça, considerando o fato de que você vem de uma família com uma longa tradição no automobilismo?
Na época, meu tio e meu avô eram fotógrafos de uma revista especializada em carros da Alemanha, então, antes de começar a correr, cheguei a pensar em seguir o mesmo caminho.
Ser um Winkelhock te ajudou de alguma maneira? Caso contrário, o quanto foi difícil conseguir um lugar ao sol, considerando o fato de você ter iniciado nas pistas aos 18 anos, que é considerada uma idade avançada para os padrões atuais do automobilismo?
Acho que o sobrenome me ajudou em alguns casos, mas também tive muita pressão sobre os meus ombros, desde a primeira corrida, pois todo mundo estava de olho em mim. Então, eu precisava andar bem o tempo todo. Mas sem nenhuma experiência, nem mesmo no kart, não foi nada fácil.
O pequeno Markus e seu pai, em 1982 |
Na verdade, não. Quando vejo algum vídeo dele, é como se fosse uma pessoa que eu nunca conheci, infelizmente.
No Brasil, geralmente as pessoas não se lembram dos grandes ídolos do esporte. Elas sabem muito sobre Ayrton Senna, por exemplo, mas quase nada sobre José Carlos Pace ou Chico Landi. De que maneira seu pai é lembrado hoje na Alemanha? O quanto as novas gerações de fãs da Fórmula 1 sabem sobre ele ou o Stefan Bellof?
Muitas pessoas ainda se lembram do meu pai e do nome Winkelhock, o que me enche de orgulho. Ele tornou o sobrenome famoso e deu a mim e ao meu tio (Joachim) a oportunidade de fazer o mesmo. É legal ver nossa família correndo pelo mundo por quase 45 anos.
Manfred Winkelhock |
Sim, eu estive lá em 2015. Conversei com o médico que o atendeu na época e também fui à delegacia local, que até hoje tem guardada a documentação sobre o acidente. Infelizmente, não consegui descobrir a verdadeira causa. O Marc Surer, que foi o companheiro de equipe do meu pai naquela corrida, está certo de que foi uma falha no pneu, enquanto outras pessoas dizem que pode ter sido uma quebra na suspensão dianteira. Mas todos com quem eu falei têm 99% de certeza de que meu pai não cometeu nenhum erro. Gostaria de ter descoberto a razão para tudo aquilo ter acontecido, mas é algo que não o teria trazido de volta. O pior disso tudo é saber que durante o resgate ele foi derrubado duas vezes da maca.
Depois de oito anos competindo em monopostos e também no turismo, como surgiu o convite para ser piloto reserva da Midland, em 2006?
Eu já conhecia o Colin Kolles muito bem, e ele era o chefe da equipe na época e me deu essa chance.
No ano seguinte, a equipe já estava rebatizada como Spyker, você foi convocado de última hora para disputar o GP da Europa, no lugar do Christijan Albers, e 18 anos depois o sobrenome Winkelhock estava de volta à Fórmula 1. Qual foi sua reação após receber o convite? Era algo que você já estava esperando? Posso imaginar o quanto esse momento foi especial para sua família, especialmente a sua mãe.
Foi muito legal. Para qualquer piloto, uma das grandes metas é correr na Fórmula 1. Mas eu sabia que, provavelmente, faria apenas aquela corrida, porque não tinha verba suficiente de patrocínio para me garantir até o final da temporada. De qualquer modo, foi uma experiência que jamais vou esquecer e ninguém poderá me negar o fato de que liderei meu primeiro Grande Prêmio em meu próprio país.
Sua estreia foi justamente em Nürburging, onde seu pai correu pela última vez na Fórmula 1. Você se deu conta disso quando recebeu o convite da Spyker?
É verdade, mas eu só me dei conta disso depois daquele fim de semana. Coisas do destino, provavelmente.
Naquela época, a Fórmula 1 já tinha mudado bastante e até hoje é conhecida como um ambiente duro, muito desafiador e de muita pressão. Seu tio chegou a te dar algum conselho em relação a isso, uma vez que ele também já esteve lá nos anos 80?
Não, de forma alguma. Sempre quis fazer as coisas do meu jeito e por isso nunca pedi a ele qualquer tipo de ajuda ou dicas. Queria aprender com meus próprios erros.
As notícias da época diziam que, no dia da corrida, você estava usando um cordão com a aliança de casamento do seu pai pendurada nele. O que esse gesto tão especial representou para você e sua família?
Sim, isso é verdade. Minha mãe me deu a aliança quando comecei a correr, para me dar sorte. E desde então, uso toda vez vez que entro em um carro.
Antes da largada, dava para ver as nuvens negras sobre a área do hairpin. Sendo alemão, e provavelmente bom conhecedor do clima da região, foi você quem pediu para voltar ao pitlane e pedir para colocar os pneus intermediários ou a decisão foi apenas da equipe?
Na verdade, eu vi aquelas nuvens chegando e disse a eles, pelo rádio, que já tinha algumas gotas na minha viseira. Isso quando eu já estava a 500 metros da entrada dos boxes. Depois de algum silêncio, faltando apenas 50 metros, eles mandaram eu entrar e trocar os pneus. Nessa hora, era o Mike Gascoyne, o diretor técnico na época, quem já tinha tomado a decisão.
Em 2007, liderando o GP da Europa |
Eu não podia acreditar naquilo! Mas estava tão focado em fazer meu trabalho nessa hora... Eu nunca tinha guiado um carro de Fórmula 1 na chuva, então você pode imaginar que não havia nem tempo para ficar feliz por liderar a corrida.
Depois que você abandonou, na 13ª volta, qual era o clima no paddock?
Quando voltei aos boxes, a equipe toda estava feliz e sorrindo. Eu estava muito feliz e enlouquecido com tudo aquilo, no bom sentido. Era como se fosse um sonho. Nem fiquei com raiva por não ter terminado a corrida. Eu estava feliz por algo divertido e que aconteceu em um dia especial da minha vida.
Infelizmente, a Spyker decidiu continuar a temporada com o Sakon Yamamoto e não com você. O motivo foi apenas a falta de patrocínio ou teve outro motivo?
Nenhum outro motivo. Foi falta de grana mesmo.
Nenhuma outra equipe te chamou com uma oferta na mesa? Você chegou a tentar conseguir ajuda de patrocinadores locais? O que aconteceu depois?
Não houve nenhuma oferta ou algo parecido, mas eu também estava correndo no DTM em 2007, então direcionei meu foco para me tornar um piloto de fábrica da Audi em 2008, o que funcionou muito bem para mim. Não fiquei chateado por não ter continuado na Fórmula 1, mesmo se eu quisesse ter feito a toda a temporada.
Depois desse momento tão especial e com o fim do sonho da Fórmula 1, você teve grandes momentos competindo de turismo, incluindo os títulos do FIA GT1 em 2012 e do Blancpain em 2018, além de ter vencido as 24 Horas de Spa-Francorchamps e de Nürburgring. Fazendo um retrospecto, como você avalia tudo o que conquistou no automobilismo até agora?
Sou absolutamente feliz por tudo o que conquistei nesses últimos anos e com a Audi e espero que venha muito mais!