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sábado, 1 de agosto de 2020

Patrick Depailler: 40 anos de saudades

Se em seus primeiros anos de história a Fórmula 1 teve que dividir as alegrias do espetáculo que promovia com a tristeza causada pela perda de alguns dos maiores nomes do automobilismo mundial, a década de 80 indicava que a realidade poderia ser bem diferente.

Já sob a gestão de Bernie Ecclestone, a categoria visava não somente alcançar o um nível de profissionalismo nunca antes visto no esporte a motor, mas também o status de ter os mais altos padrões de segurança nas pistas.

De fato, os anos seguintes provaram que a Fórmula 1 alcançou seu objetivo, principalmente após a tragédia de Ímola, que nos tirou Ayrton Senna e Roland Ratzenberger. Porém, no começo dos anos 80, acidentes graves ainda eram frequentes e, apesar de alguns padrões de segurança já estabelecidos, as falhas existiam. Como consequência, a morte de vez em quando ainda pairava sobre a categoria, sem aviso prévio. Foi o que aconteceu em 1º de agosto de 1980, em Hockenheim, na Alemanha, quando um acidente durante testes privados da equipe Alfa Romeo tirou a vida do francês Patrick Depailler.

O início em duas rodas

Nascido em 9 de agosto de 1944, na cidade de Clermont-Ferrand, Patrick André Eugène Joseph Depailler, assim como vários pilotos de sua época, nunca demonstrou grande interesse pelos estudos, preferindo sempre as brincadeiras e aventuras ao ar livre durante a infância e adolescência.

Sua família bem que tentou algum progresso. Com certo esforço e só depois de muita insistência, Depailler foi para a universidade, saindo de lá com o diploma de dentista, profissão que nunca chegou a exercer. Àquela altura, o jovem francês já tinha sido arrebatado pela velocidade, desde que, ainda adolescente, assistira a uma corrida de motos no circuito de Charade, perto de sua cidade natal.

Sua estreia nas pistas se deu em 1962, nas motos, competindo com uma Benelli de 50 cilindradas, mas em 1966, contando com a ajuda do compatriota Jean-Pierre Beltoise, entrou definitivamente para o automobilismo. Passou boa parte de sua carreira na Fórmula 3, correndo pela equipe Alpine, com a qual sagrou-se campeão em 1971, após um breve período de maus resultados na Fórmula 2, em 1970.

O sonho da Fórmula 1

Em 1972, estreou na Fórmula 1, onde disputou os GPs da França e dos Estados Unidos, com um Tyrrell 004 emprestado, graças também ao apoio que passou a receber da petrolífera francesa Elf e de seu chefe na Fórmula 2, John Coombs. O carro era quase novo.

Disputando uma prova da Fórmula 2 em Nürburgring, na Alemanha.

Apesar de ter sido construído no final de 1971, até então o Tyrrell 004 só tinha sido usado por Jackie Stewart em duas corridas da temporada seguinte, na África do Sul e em Mônaco. Para Depailler, não poderia haver oportunidade melhor do que estrear na Fórmula 1 diante de sua torcida e em Clermont-Ferrand, uma pista que ele conhecia muito bem.

Na França, a sorte não esteve ao seu lado e Depailler sofreu diversos problemas com os pneus. Terminou a prova na 20ª colocação, a cinco voltas do vencedor - Jackie Stewart -, e por isso foi desclassificado, por não cumprir a distância total mínima exigida pelo regulamento. Seu desempenho, no entanto, foi suficiente para impressionar Ken Tyrrell e receber dele o convite para disputar o GP dos Estados Unidos, no final da temporada. Nesta prova, terminou em sétimo lugar.

Em 1973, Depailler passou todo o ano correndo na Fórmula 2, vencendo em Thruxton e Pau, além de conquistar diversas poles, voltas mais rápidas e pódios durante a temporada. Terminou o campeonato em terceiro, pelo segundo ano consecutivo, com 38 pontos, atrás de Jean-Pierre Jarier e Jochen Mass, campeão e vice, respectivamente. Nesse mesmo ano, disputou também as 24 Horas de Le Mans, dividindo um Matra-Simca MS670 com Bob Wollek, tendo de abandonar a prova com problemas na pressão do óleo.

Na Tyrrell, a primeira vitória

Em 1974, disputando o GP da Suécia, em Anderstop. Terminou em segundo.

Impressionado com os resultados do jovem piloto francês, o velho Ken Tyrrell fez outro convite a Depailler, desta vez para que ele fosse um dos pilotos oficiais de sua equipe em 1974, após a morte de François Cévert durante os treinos para o GP dos Estados Unidos de 1973 e a consequente antecipação da aposentadoria de Jackie Stewart. Na Tyrrell, Depailler foi um piloto bastante regular, quase sempre marcando pontos para o campeonato, no período em que a Tyrrell começava seu declínio. A tão sonhada primeira vitória veio somente em 1978, no GP de Mônaco.

A consagração maior de sua carreira ao vencer o GP de Mônaco, em 1978.

Em 1979, mudou-se para a Ligier, pela qual obteve alguns bons resultados e venceu pela segunda vez, no GP da Espanha. Dois meses depois, seu gosto natural por esportes radicais novamente o pôs de molho. Desta vez, a causa foi um acidente de asa-delta, em que quebrou as duas pernas, obrigando-o a não disputar o restante da temporada. Depois do acidente, sua única partipação na Fórmula 1 foi como mero expectador, nos GPs do Canadá e dos Estados Unidos.

O fim

Contornando as ruas do Principado de Mônaco pela última vez, em 1980.

Em 1980, foi correr pela Alfa Romeo, que tinha retornado à Fórmula 1 após mais de duas décadas de ausência. Seu carro era rápido, mas nada confiável. Como resultado, Depailler não completou as oito primeiras provas do campeonato, situação que contrastava e muito com o que seu talento era capaz de oferecer. E seria assim até o fim, quando, no dia 1º de agosto daquele ano, durante testes privados em Hockenheim, na Alemanha, Depailler bateu violentamente contra o guard-rail da Ostkurve, a 270 km/h. Com o impacto, o carro foi arrastado por cerca de 50 metros por cima das barreiras, com Depailler dentro.

Os destroços da Alfa Romeo 179 após o acidente em Hockenheim.

Depailler já estava em coma quando foi retirado das ferragens, além de apresentar fraturas nas pernas e no crânio. A situação ficou ainda pior quando foi constatado que o piloto estava em estado de choque, o que indicava sinais de hemorragia interna.

Levado de helicóptero para o Hospital Universitário de Heidelberg, Depailler foi declarado morto 50 minutos depois. Em Clermont-Ferrand, mais de duas mil pessoas estiveram presentes em seu enterro, entre eles alguns de seus colegas e amigos da Fórmula 1, como Ken Tyrrell, Emerson Fittipaldi, Gilles Villeneuve e Jody Scheckter. E assim, a Fórmula 1 perdia um dos pilotos mais populares e carismáticos que a categoria já teve.

* Créditos das Fotos: Lothar Spurzem e Motorsport Retro (outras fotos são de autores desconhecidos)

domingo, 5 de março de 2017

Tom Pryce e a tragédia de Kyalami

Nos anos 70, quando a Fórmula-1 começou a atingir altos índices de audiência nas transmissões de TV em todo o mundo, havia uma espécie de imposto macabro a ser pago a cada temporada. A explicação é simples: naqueles tempos, pelo menos um ou dois pilotos, em média, perdiam a vida tragicamente nas pistas. E foi graças a essa estranha combinação entre o perigo e a negligência com a segurança que o galês Tom Pryce, infelizmente, passou a fazer parte dessa triste estatística.

Nascido a 11 de junho de 1949, em Ruthin, no País de Gales, Thomas Maldwyn Pryce era o segundo filho do casal Jack, um ex-membro da Força Aérea Real Britânica, e Gwyneth, enfermeira. Seu interesse pelo automobilismo surgiu ainda na infância, aos 10 anos, quando dirigiu sozinho uma pequena van de propriedade da família. Ciente de que o futuro do filho estava nas corridas, sua mãe ainda tentou convencê-lo a estudar mecânica de tratores, como um plano B, caso sua trajetória nas pistas não tivesse sucesso.

Pryce iniciou a carreira no automobilismo em 1970, ao vencer o Daily Express Crusader Championship, a bordo de um Lotus 51 usado pela Formula-Ford. A partir daí, passou a disputar corridas em diversas categorias, como a Fórmula Super V, a Fórmula 3 e a Fórmula Atlantic, sendo campeão em 1971 na Fórmula F100. Ao apostar suas fichas na Fórmula 2, obteve um dos melhores resultados de sua carreira até então, terminando a etapa de Norisring, na Alemanha, em segundo lugar, depois de ter liderado boa parte da prova, vencida por Tim Schenken, seu companheiro de equipe na Motul Rondel Racing, de propriedade de um ainda desconhecido Ron Dennis.

A carreira na Fórmula 1

Tom Pryce, a bordo do UOP Shadow DN5

Em 1974, Pryce realiza fez sua estréia na Fórmula 1 pela novata Token, no GP da Bélgica, em Spa Francorchamps, abandonando a prova depois de 66 voltas, após uma colisão com o sul-africano Jody Scheckter. Nesse mesmo ano, assina com a Shadow, estreando pela equipe no GP da Holanda, em Zandvoort, mas um acidente com o alemão Hans-Joachim Stuck o levou a abandonar a prova na primeira volta. O primeiro ponto na categoria veio no GP da Alemanha, ao terminar em sexto. No final do campeonato, terminou em 18º na classificação geral, empatado com Vittorio Brambilla e Graham Hill.

Em 1975, obteve sua única vitória na categoria, durante a Corrida dos Campeões, que não contava pontos para o campeonato. Pryce ainda obteve bons desempenhos nessa temporada, largando na primeira fila na Inglaterra e em Mônaco, além de conquistar seu primeiro pódio, terminando em terceiro no GP da Áustria. Na Alemanha, terminou em quarto, quase sem combustível, que começou a vazar nas últimas voltas. Foi o suficiente para conquistar o Troféu Rouge et Blanc, premiação concedida aos pilotos mais combativos na pista. Encerrou a temporada com oito pontos, na décima colocação.

No ano seguinte, terminou em terceiro no GP do Brasil, obtendo ainda resultados razoáveis na Alemanha e na Holanda. Mas as alterações no regulamento, que exigiam das equipes mudanças radicais em seus carros, fizeram com que a Shadow perdesse muito de sua competitividade ao longo daquele ano.

O fim repentino

Em 1977, os resultados da Shadow não foram o que Pryce esperava. Na Argentina, largou em nono e abandonou na 45ª volta, com problemas no câmbio. No Brasil, largou em 12º e abandonou novamente, na 34ª volta, com uma falha no motor. Na África do Sul, foi o mais rápido nos treinos em pista molhada, onde sempre obtinha melhor desempenho. Já em pista seca, a realidade veio à tona e ele se vê obrigado contentar-se com o 15º lugar no grid. Na largada, cai para o último lugar, mas em 20 voltas já era o 13º colocado.

Duas voltas depois, seu companheiro de equipe, Renzo Zorzi (falecido em 2015), para no acostamento da reta principal com um princípio de incêndio. Imediatamente, dois bombeiros voluntários atravessam a pista para ajudar o piloto italiano, misturando rapidez no atendimento e imprudência no instinto de cumprir a tarefa para a qual haviam sido escalados. Um deles era Frederick Jansen van Vuuren, de apenas 19 anos, que trabalhava como emissor de passagens no Aeroporto Internacional de Joannesburgo. Vale lembrar que ambos atravessaram a pista sem permissão dos fiscais de prova.

A essa altura, Stuck, Pryce, Jacques Laffite e Gunnar Nilsson já se aproximavam do local do acidente. Ao passar pela lombada da longa reta de Kyalami, Stuck conseguiu desviar a tempo de Vuuren, mas Pryce, que vinha logo atrás, não teve a mesma sorte e, sem reação, atropelou o rapaz.



O que se viu a partir daí foi uma das cenas mais trágicas já transmitidas durante uma corrida. Com o impacto, o extintor de Van Vuuren acertou em cheio a cabeça de Pryce, arrancando-lhe o capacete e matando-o na hora. A força do impacto foi suficiente para lançar o extintor até o estacionamento localizado atrás da arquibancada principal do circuito.

Sepultura de Tom PryceO carro de Pryce ainda seguiu pela reta completamente desgovernado até atingir a Ligier de Laffite, na entrada da curva Crowthorne. O piloto francês não teve nenhum ferimento, mas sofreu o horror de ver o colega morto e desfigurado dentro do cockpit. Quanto a Van Vuuren, seu corpo foi mutilado de tal forma que o reconhecimento só foi feito depois da corrida, por exclusão.

Esse era um dos preços a serem pagos pela junção da imprudência com o amadorismo que reinava na Fórmula 1 dos anos 70. Após o acidente, a viúva de Pryce, Nella, travou uma batalha de três anos até conseguir dos administradores do circuito de Kyalami uma indenização por terem contratado um amador para trabalhar como bombeiro.

Anos depois de sua morte, Pryce receberia diversas homenagens, como o lançamento do The Tom Pryce Award, concedido anualmente a qualquer cidadão galês que tenha contribuído de forma significativa para o automobilismo e o setor de transporte do país. Outras homenagens locais vieram em seguida, como foi o caso do Circuito Anglesey, que teve uma de suas retas batizada com o nome do piloto.

Em 2006, foi criado um fundo para ajudar na criação de um memorial em homenagem a Pryce, em sua cidade natal. A iniciativa partiu do sul-africano Eddie Knipe, após obter a autorização de Nella e dos pais do piloto. O memorial foi inaugurado em 11 de junho de 2009, em comemoração pelos 60 anos de Pryce, com uma placa esculpida com sua imagem, criada pelo artista local Neil Dalrymple.

Tom Pryce Memorial, inaugurado em 2009, em Ruthin, em homenagem pelos 60 anos do piloto

O corpo de Pryce está enterrado na cidade de Otford, na Igreja de São Bartolomeu, a mesma onde ele e Nella haviam se casado dois anos antes do fatídico acidente, quando o automobilismo mundial perdeu um de seus mais promissores pilotos, que aos poucos conquistou o respeito de todos que acompanharam sua trajetória nas pistas. Jack, seu pai, morreu em 2007, apenas dois dias depois do 30º aniversário da morte de seu filho. Gwyneth faleceu em 17 de outubro de 2009, aos 83 anos.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

O piloto do dia: Keith Greene

O aniversariante do dia é o ex-piloto inglês Keith Greene, que hoje comemora 79 anos de vida. Iniciou a carreira em 1955, correndo de carros protótipos, onde teve razoável sucesso em campeonatos nacionais (confira todos os resultados de sua carreira).

Na Fórmula 1, disputou apenas três corridas, ao mesmo tempo em que continuava competindo em outras categorias. A estreia na principal categoria do automobilismo mundial foi em 1960, no GP da Grã-Bretanha, correndo a bordo de um Cooper T45 da Gilby Engineering, equipe fundada por seu pai, Sid.

Correndo em casa, Keith largou na 22ª posição e abandonou depois de 12 voltas, com problemas de superaquecimento. No ano seguinte, também na Grã-Bretanha, terminou na 15ª posição. Em 1962, na Alemanha, deixou a prova depois de 7 voltas, com quebra na suspensão.

Após deixar as pistas, em 1967, continuou envolvido com o esporte a motor, tanto em categorias de esporte protótipo quanto na Fórmula 1, onde foi chefe de equipe da Brabham, em 1972.

domingo, 1 de janeiro de 2017

Jacky Ickx, o Baby Face da Fórmula 1

(Jacky Ickx - Fonte: Audi Motorsport)Incentivado pelo pai e pelo irmão, ambos ex-pilotos, o jovem Jacques-Bernard Ickx iniciou de forma precoce sua carreira no esporte a motor com apenas 12 anos, disputando provas de motocross. Venceu oito corridas em seu primeiro ano de competições e conquistando o título na categoria 50cc em 1964 e 1965. Na fase adulta, aos 20 anos, estreou no automobilismo, primeiro competindo com carros de turismo, como BMW 700S e Lotus Cortina, demonstrando grande habilidade ao volante.

Apesar da aparência jovial mesmo na fase adulta - o que lhe rendeu o apelido de Baby Face - Ickx tinha talento suficiente para competir nas mais diversas categorias, Ele ainda passaria alguns anos com os carros de turismo e alguns monopostos até a estreia na Fórmula 1, em 1967, no GP da Itália, pela equipe Cooper. Nessa prova, largando entre os últimos do grid, Ickx não teve grande destaque, apesar de terminar a prova em sexto, em grande parte como resultado do abandono dos demais competidores. Na corrida seguinte, nos Estados Unidos, abandonou na 45ª volta, com problemas de superaquecimento.

No ano seguinte, já como piloto da Ferrari, conquistou sua primeira vitória na categoria, no GP da França, disputado em Rouen sob forte chuva - mais tarde, Ickx revelaria ter um talento especial para vencer nessas condições -, terminando a temporada na quarta colocação. Em 1969, correndo pela Brabham, os bons resultados, incluindo uma vitória na Alemanha e outra no Canadá, foram suficientes para lhe garantir o vice-campeonato da temporada.

Em 1970, de volta à Ferrari, disputou o título até a penúltima etapa, nos Estados Unidos, onde só perdeu a liderança no campeonato com a vitória de Emerson Fittipaldi - sua primeira na Fórmula-1 -, que dessa forma garantiu o título ao companheiro de equipe já morto, Jochen Rindt, e à Lotus. Ickx ainda venceria a última etapa, no México, mas sem obter a pontuação necessária para ultrapassar Rindt na classificação geral.

Jacky Ickx no GP de Mônaco de 1971, a bordo da Ferrari 312B2

Ickx correria ainda mais três anos pela Ferrari, com resultados abaixo do esperado e somando apenas duas vitórias nesse período, sendo uma na Holanda (1971), novamente com chuva, e outra na Alemanha (1972). No Mundial de Marcas de 1972, também correndo pela equipe italiana, a situação foi inversa, resultando em seis vitórias e o título de campeão da temporada. Mas na Fórmula-1, a falta de bons resultados levam-no a deixar a Ferrari em um clima nada amigável, chegando a disputar uma prova pela McLaren e outra pela Williams antes de se transferir para a Lotus, em 1974.

Na equipe de Colin Chapman a situação não foi diferente e Ickx se vê obrigado a suportar mais uma série de abandonos durante dois anos, apesar de alguns pódios obtidos nesse período. As coisas se tornariam ainda piores na Wolf, na Ensign e, finalmente, na Ligier, onde encerrou definitivamente sua participação na Fórmula-1.

Nos anos seguintes, Ickx dedicou-se exclusivamente às corridas de protótipos, com destaque para o bicampeonato no Mundial de Endurance em 1982 e 1983 e um total de seis vitórias nas 24 Horas de Le Mans. Encerrou a carreira como profissional em 1984, após o acidente em Spa-Francorchamps, que resultou na morte do alemão Stefan Bellof. A partir daí, Ickx passou a competir regularmente em provas de rally até 1992. Hoje, eventualmente participa de eventos históricos ligados ao automobilismo, como o Festival de Goodwood, na Inglaterra.

Outras Informações:

Nascimento: 1º de janeiro de 1945 - Bruxelas / Bélgica

Estréia na Fórmula-1: 1967 (GP da Itália / Cooper-Maserati)
Equipes: Cooper, Ferrari, Brabham, McLaren, Williams, Lotus, Wolf, Ensign e Ligier
GPs Disputados: 114
Vitórias: 8
Pole Positions: 13
Largadas na 1ª Fila: 25
Melhores Voltas: 14
Voltas na Liderança: 19
Pódios: 25
Pontos: 181
Abandonos: 48
Melhor Resultado: Vice-campeão (1969 e 1970)

quinta-feira, 19 de maio de 2016

Você sabe tudo sobre Fórmula 1?

Grill The Grid, com Marcus Ericsson
O canal oficial da Fórmula 1 no YouTube tem divulgado, acho que a cada semana, alguns vídeos de uma série intitulada Grill The Grid. Nada mais é do que um quiz para testar os conhecimentos dos pilotos atuais sobre a categoria, suas próprias carreiras, suas estatísticas, equipes, os GPs e pilotos de seus países de origem e atuais companheiros de equipe.

A ideia é bem interessante. Hoje, foi divulgado o vídeo com o Marcus Ericsson se submetendo à sabatina. Em uma das perguntas, o piloto sueco acabou passando vergonha ao não saber responder o significado do "C" que batiza os nomes dos carros da Sauber a cada temporada. A gafe é engraçada por si só, levando a um pedido de desculpas ao patrão, Peter Sauber.


O placar até agora é liderado por Felipe Massa, que acertou oito das dez perguntas feitas a ele. Em segundo lugar no ranking, vem o menino-prodígio Max Verstappen, com 7,5 pontos. Marcus Ericsson vem em terceiro, com 4,5 pontos, seguido por Nico Hülkenberg, com 4.

Quem quiser acompanhar toda a disputa desde o início, é só dar um play nos vídeos abaixo.



quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Takachiho Inoue: susto e comédia na Hungria

Vindo de uma experiência fracassada na Simtek, em 1994, depois de abandonar o GP do Japão daquele ano na terceira volta, Takachicho Inoue queria a todo custo tirar proveito da popularidade da Fórmula-1 em sua terra natal. Foi pensando assim que, com a ajuda de alguns patrocinadores locais, não hesitou em desembolsar US$ 4,5 milhões por um lugar na Arrows com um só objetivo: disputar a temporada de 1995.

Um pequeno descuido e o pobre Inoue é lançado pelos ares, para espanto dos fiscais ao seu redor

Piloto pouco expressivo, Inoue vinha fazendo uma péssima temporada, com resultados bem abaixo do esperado. Em Mônaco, protagonizou uma cena inimaginável até então. Nos treinos livres, ao ser rebocado para os boxes com o motor desligado, teve sua Arrows atingida pelo safety car e foi arrastado por alguns metros pela pista, mas de cabeça para baixo. Virou motivo de piadas durante todo o fim de semana.

Felizmente, tudo não passou de um susto e a cena tornou-se mais cômica do que assustadora

Mal sabia Inoue que, três meses depois, mais uma vez ele ganharia destaque na imprensa, como resultado de um dos momentos mais bizarros da história da Fórmula-1 e que gerou as famosas fotos que ilustram este post.

O episódio aconteceu no GP da Hungria, no dia 13 de agosto de 1995. Com um princípio de incêndio em seu carro, Inoue precisou abandonar a prova na 13ª volta. No desespero para tentar apagar o fogo com um extintor, Inoue não percebeu a aproximação do carro da equipe de socorro, sendo atropelado e jogado sobre o capô, de pernas para o ar. Segundos depois, um dos fiscais que assistiram à cena preferiu cuidar do incêndio do carro, ignorando completamente o pobre piloto.

O acidente não foi grave. Inoue teve a perna esquerda levemente ferida e, duas semanas depois, estava de volta ao grid para disputar o GP da Bélgica. Mas certamente deixou a Hungria com protagonista de uma das cenas mais cômicas já vistas na categoria.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Manfred Winkelhock (06/10/1951 - 12/08/1985)

Manfred Winkelhock, em 1985, na RAM
Quem acompanhava a Fórmula 1 nos anos 80 sabe que a temporada de 1985 terminou com um gosto amargo para os torcedores alemães. Isto porque, enquanto Alain Prost e Michele Alboreto brigavam pelo título, a Alemanha sentia um duro golpe, ao perder dois pilotos em apenas três semanas.

Um deles foi Manfred Winkelhock, de quem muita gente se lembra por causa do famoso acidente sofrido em Nürburgring, em 1980, durante uma prova de Fórmula 2, e que resultou em uma incrível série de capotagens da qual o piloto alemão saiu ileso. Quem acompanhava os acidentes da antiga série Havoc, nas hoje empoeiradas fitas VHS, certamente ainda se lembra muito bem dessa cena.

Mas Manfred fez muito mais do que protagonizar um acidente assustador. Embora sem grandes resultados nas pistas, era considerado um piloto extremamente dedicado, rápido e audacioso, conhecido também por saber extrair sempre o máximo que seu equipamento permitia. Na Fórmula 1 não foi diferente, e não demorou muito para que seu estilo chamasse a atenção dos observadores mais atentos.

Nascido em 6 de outubro de 1951, na pequena cidade de Waiblingen, próximo a Stuttgart, era o filho mais velho do casal Manfred e Ruth. Antes de iniciar a carreira nas pistas, deu duro trabalhando como eletricista e mecânico, especializado em caminhões. Nessa época, o automobilismo já atraía sua atenção, levando-o competir algumas vezes nos finais de semana, em provas de subida de montanha.

Mesmo nos anos 70, sua carreira nas pistas começou tarde, aos 24 anos, quando competiu na Copa Volkswagen Scirocco, obtendo quatro vitórias e o título de campeão. Foi o suficiente para que, em 1977, passasse para a equipe junior da BMW, tendo Eddie Cheever e Marc Surer como companheiros. Ao final daquela temporada, terminou em terceiro na classificação geral, com uma vitória em Hockenheim.

Manfred Winkelhock e o carro que o consagrou campeão da Copa Volkswagen Scirocco, em 1976

No ano seguinte, mudou-se para a Fórmula 2, mas a falta de experiência custou caro e Manfred terminou o ano apenas na nona posição, com um pódio e 11 pontos na classificação geral. O ano só não foi tão ruim por conta das duas vitórias que conquistou no Campeonato Alemão de Turismo, que disputava paralelamente à Fórmula 2 e de onde saiu campeão. Em 1979, somou três vitórias e um terceiro lugar nas 24 Horas de Le Mans. Nesse mesmo ano, Manfred continuou na Fórmula 2, onde obteve mais alguns pódios, pela equipe Cassani Racing.

Em 1980, permaneceu mais um ano na Fórmula 2. Foi quando sofreu o pior acidente de sua vida até então, em Nürburgring. Ao perder o controle de seu carro, teve o assoalho danificado e, com isso, levantou um voo espetacular - provocado pelo efeito-solo dos carros-asa -, parando somente nos guard-rails, depois de seis incríveis capotagens.

Para surpresa de todos, o piloto tedesco saiu do carro andando, como se nada tivesse acontecido. Para Manfred, o único incidente foi um acesso de vômito sofrido horas depois de ter visto a cena pela TV. Este acidente, somado às mortes de Gilles Villeneuve e Riccardo Paletti dois anos depois, fez com que os carros-asa fossem proibidos pela FIA, em 1983.


Ainda em 1980, tentou a sorte na Fórmula 1, na equipe Arrows, substituindo o compatriota Jochen Mass. Mas o fraco motor Cosworth, que começava a dar sinais de declínio com a chegada dos motores turbo à categoria, impediu que Manfred conseguisse se classificar para o GP da Itália.

Depois disso, Manfred ainda disputou mais uma temporada da Fórmula 2 e no Campeonato Alemão de Turismo (hoje DTM), em 1981, até que, no ano seguinte, finalmente retorna à Fórmula 1, com um contrato assinado com a ATS, graças ao apoio da BMW, fornecedora dos motores turbo da equipe naquele ano.

Em 1980, tentativa frustrada de estreia na Fórmula 1, ao tentar se qualificar para o GP da Itália

A temporada não foi das melhores. Apesar de algumas boas classificações no grid, seu melhor resultado foi um quinto lugar em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Era sua segunda corrida na Fórmula 1. Mas os resultados nunca eram os esperados. Quando o problema não era o motor, eram a pouca experiência e os erros de Manfred que cobravam seu preço, como aconteceu em Detroit, ao rodar e abandonar a prova depois de apenas cinco voltas.

Para complicar a situação da ATS (ou de qualquer outra equipe pequena), o sexto lugar obtido em Imola não resultou em nada. Manfred fora desclassificado, pois seu carro tinha o peso mínimo abaixo do exigido pelo regulamento.

Em 1983, sem muitas opções, Manfred continuou com a ATS, desta vez com mais experiência e mais confiança. Mas o carro, totalmente construído em fibra de carbono, era pouco confiável, deixando o piloto muitas vezes parado no acostamento, a poucas voltas para o final das provas. No ano seguinte, Manfred já era, digamos, prata da casa na ATS, mas contra a vontade do chefe, Hans Gunther Schmid, que teve de mantê-lo na equipe por exigência da BMW. E a mesma situação da temporada anterior se repetiu: bom desempenho nos treinos e resultados pífios durante as corridas.

Em 1984, a bordo da ATS, durante os treinos para o GP da Inglaterra, no circuito de Brands Hatch

Com a chegada do austríaco Gerhard Berger ao time, Manfred não vê outra saída senão deixar a ATS antes do final da temporada, uma vez que dificilmente a equipe conseguiria ter no grid dois carros em condições iguais de disputa. Naquele mesmo ano, chegou a fazer alguns testes com a Zakspeed e, em Portugal, correu pela Brabham, terminando a prova na décima posição.

Em 1985, seu destino seria a RAM, equipada com os fraquíssimos motores Hart. O resultado não poderia ser outro: a maré de azar não deu trégua e Manfred passou a marcar presença nas últimas posições. Isso quando não abandonava as provas.

Em Silverstone, Manfred tenta a sorte mais uma vez, agora pela fraquíssima equipe RAM

Com chances mínimas de continuar na Fórmula 1 no ano seguinte, e já sem garantias do apoio da BMW, Manfred decide voltar às provas de turismo. Ainda em 1985, assinou com a equipe alemã Kremer Motorsport, pela qual passaria a disputar o Mundial de Marcas, a bordo de um Porsche 962, em paralelo ao seu trabalho com a RAM. Sua sorte começou a mudar. Aos poucos, tornou-se um dos principais pilotos da categoria, o que ficou comprovado ao vencer os 1000 Km de Monza, na Itália.

No Canadá, foi a vez de disputar os 1000 km de Mosport. Manfred assumiu o volante na segunda hora da corrida, depois de a equipe ter feito o reparo de uma avaria na suspensão traseira esquerda, após um acidente sofrido por seu companheiro, Marc Surer, no começo da prova. Na segunda curva, quando abria a 70ª volta da corrida, Manfred passou reto, a 230 km/h, em direção ao muro de concreto, destruindo completamente o lado direito do carro. A causa do acidente nunca foi esclarecida, com as suspeitas caindo sobre uma provável falha nos freios.

No Canadá, equipes atendem Winkelhock após o acidente que lhe tirou a vida um dia depois

Foram necessários cerca de 40 minutos para que a equipe de socorro tirasse Manfred do carro, inconsciente e com ferimentos na cabeça e nas pernas. Levado de helicóptero para o Sunny Brook Medical Center, em Toronto, o piloto foi operado na mesma noite, na tentativa de conter uma hemorragia cerebral.


A situação tornou-se ainda pior nas horas seguintes, levando Surer a entrar em contato com a família de Manfred, para informá-la da situação e pedir que pegasse um voo rumo ao Canadá. Na segunda-feira, dia 12 de agosto de 1985, Manfred Winkelhock foi declarado morto, aos 33 anos. Nesse momento, estavam presentes seus pais e a esposa, Martina, a quem Manfred conheceu ainda menina, pois eram vizinhos. O piloto deixou ainda dois filhos, Markus, então com cinco anos, e Marina, de apenas um ano e meio.

Seu enterro, em sua cidade natal, contou com a presença de cerca de mil pessoas, entre elas Hans-Joachim Stuck e Michele Alboreto, além de Bernie Ecclestone. E assim, a Fórmula 1 deu adeus a um dos pilotos mais queridos do grid. No total, Manfred disputou 47 Grandes Prêmios, tendo como melhor resultado um quinto lugar no GP do Brasil, em 1982.

Em 2007, seu filho, Markus, então substituto do holandês Christijan Albers na equipe Spyker, surpreendeu e emocionou muita gente na Fórmula 1. Foi durante o GP da Europa, em Nürburgring, quando se aproveitou de uma chuva repentina e liderou a corrida durante seis voltas. Um feito do qual seu pai certamente teria muito orgulho.

quarta-feira, 25 de março de 2015

Entrevista: Fritz d'Orey

Nascido Frederico José Carlos Themudo d’Orey, em 25 de março de 1938, Fritz d'Orey, como é mais conhecido, teve uma carreira de muito destaque nas provas que disputou no Brasil, entre elas o Campeonato Brasileiro de Automobilismo e os 500 Quilômetros de Interlagos, não só pela pouca idade, mas pelos resultados alcançados.

Naturalmente, seu nome começou a chamar a atenção não só de pilotos brasileiros, mas também entre os estrangeiros que vinham correr no Brasil. Um deles foi Juan Manuel Fangio, responsável por lhe abrir as portas para uma carreira internacional, encerrada em 1960, após um acidente nas 24 Horas de Le Mans que lhe deixou oito meses internado em um hospital.

Em maio de 2002, ainda alimentando a ideia de um dia ter um blog sobre Fórmula 1, criei coragem, consultei a lista telefônica e entrei em contato com o Fritz, pedindo um pouco do seu tempo para que ele me concedesse uma entrevista, no que fui prontamente atendido. A ideia seria publicá-la no Forix, o maior site de estatísticas sobre automobilismo existente hoje. Com a data agendada, um sábado, lá fui eu encontrá-lo em sua belíssima cobertura na Avenida Atlântica, em Copacabana, onde ele morava na época (Fritz hoje vive em Portugal).

Foram noventa minutos de conversa, em que ele lembrou de momentos marcantes de sua curta carreira - período em que teve a oportunidade de disputar três provas na Fórmula-1, nos anos 50 - e também dos grandes pilotos e muitos amigos que fez naquela época.

Durante a entrevista, ele já dizia algo que vem sendo recorrente nos dias de hoje: que o automobilismo contemporâneo era puro negócio e em nada se parecia com a época vivida por ele, quando as corridas eram disputadas apenas pelo prazer de correr. O dinheiro era apenas uma conseqüência do que um piloto era capaz de fazer nas pistas. "Eles eram seres humanos e os carros eram vistos de perto pelas pessoas. Não é como acontece hoje".

Como surgiu seu interesse pelo automobilismo?

Desde criança, sempre gostei muito de automóveis. Nessa época, eu ia sempre a Interlagos, aos sábados. Todo mundo ia para lá naquele tempo. A pista era aberta e todo mundo levava seus carros de passeio. Disputei minha primeira corrida aos 17 anos, com um Jaguar XK, mas tive uma carreira curta, de apenas cinco anos, pois aos 22 sofri um grande acidente em Le Mans, que acabou me tirando das pistas.

Sua família o apoiava naquela época?

De jeito nenhum! Antigamente, as corridas eram um perigo mortal. Todo fim de semana alguém morria em Interlagos e não havia nenhuma segurança, nada de guard-rails.

Ou seja, o que movia vocês era a pura paixão pelo esporte.

Sim, porque correr de automóvel era e ainda é uma sensação muito gostosa. Nem é a competição em si, mas o prazer de acelerar um carro de corridas.

O que significava correr pela Ferrari naquela época, sendo você tão jovem em relação aos outros pilotos? E como ocorreu sua contratação pela equipe?

Na Fórmula-1, corri pela Maserati, a convite do Juan Manuel Fangio. Foi ele quem me levou para correr na Europa, pela Scuderia Centro Sud. A British Petrolium estava patrocinando e o Fangio ia levar um brasileiro, um uruguaio e um argentino para lá. O uruguaio era o Asdrúbal Fontes Bayardo, mas não me recordo do nome do argentino. Dos três, o único que correu na Formula-1 fui eu. Os outros ficaram só nos testes. Antes disso, eu estava acostumado a correr com uma Ferrari 51, a mesma que o Chico Landi ganhou do presidente Getúlio Vargas para correr. Disputei algumas provas com ela e então a Ferrari me chamou para assinar um contrato. Na Fórmula 1, eu já tinha disputado os GPs da França, da Inglaterra e dos Estados Unidos, mas depois de ter assinado com a Ferrari, corri também nas 12 Horas de Sebring e nas 24 Horas de Le Mans, onde tive o acidente que acabou com a minha carreira.

As contratações eram muito diferentes da maneira como são feitas hoje? Eram para uma temporada inteira ou somente algumas provas, dependendo do piloto?

Naquela época, ninguém ganhava muito dinheiro. Havia corridas em todos os lugares, de todas as categorias, e os pilotos não ganhavam salário das fábricas, e sim prêmios de largada. Os organizadores davam uma determinada quantia de dinheiro, dependendo do prestígio do piloto, e a gente vivia com isso, que só dava para pagar o hotel, a alimentação e as viagens.

Mas e os campeões?

Mesmo um campeão não ganhava tanto como agora. Era só o prazer de correr que nos levava a continuar nessa vida. Dava para se sustentar sem precisar passar fome. Naquele tempo, os pilotos eram apenas seres humanos, os carros eram vistos de perto pelas pessoas. Não é como acontece hoje. A liberdade que tínhamos antes era total.

Já havia assédio dos fãs naquela época?

Ah, isso tinha! Antigamente, nós éramos vistos como heróis. Hoje, os pilotos são todos muito protegidos, com guarda-costas, essas coisas. Muita coisa mudou de lá para cá, mas já naquela época os pilotos tinham muitos fãs atrás deles.

E como era o perfil de um chefe de equipe nos anos 50?

Não era uma coisa profissional como agora. Ele era apenas o dono dos carros e nunca dava ordens para um piloto andar mais rápido do que o companheiro de equipe. Cada um andava o mais depressa que podia. Se cometesse algum erro, corria o risco de não disputar a corrida seguinte. Para se ter uma idéia de como as coisas eram feitas naquele tempo, o chefe de equipe chegava e dizia a um piloto: "Vai haver um Grande Prêmio em tal lugar. Você quer ir lá e correr para mim?" Então a gente perguntava de quanto era o prêmio de largada. Dependendo da grana, a gente ia lá disputar e recebia um adiantamento para bancar as despesas da viagem. Não havia contrato, era tudo um acordo entre amigos.

Dos pilotos que você conheceu na Europa, quem era o mais antipático e quem era o mais amigo?

Meu maior amigo era o Wolfgang von Trips, com quem eu morava junto, na Itália. Infelizmente, ele morreu em 1961, naquele acidente em Monza, onde também morreram alguns torcedores. Os mais antipáticos, na minha opinião, eram os ingleses. O Stirling Moss, por exemplo, era uma pessoa muito desagradável, um convencido, que se achava o máximo. Já os italianos eram extremamente simpáticos. O Luigi Musso era um deles. Morreu em 1958, mas cheguei a conhecê-lo. O Eugenio Castellotti também. Hoje, na Fórmula-1 atual, infelizmente os pilotos mal se falam.

Havia brigas internas entre dois pilotos de uma mesma equipe como acontece agora?

De forma alguma. Primeiro, porque todo mundo era mais amigo um do outro. E a coisa era tão perigosa que todos se ajudavam e ninguém ousava se arriscar ao extremo, porque sabia que, se fizesse isso, corria o risco de morrer e ainda levar alguém junto. Nos bastidores, nunca vi uma briga, porque a maior parte deles era formada por verdadeiros gentlemen, pessoas muito agradáveis e extremamente gentis. Isso porque muitos deles vinham de famílias bem-educadas, representavam a elite europeia, com raríssimas exceções.

 Em 1997, ao lado do Ferrari F355 Challenge
No Brasil, houve muita repercussão na imprensa pelo fato de você ter sido um jovem correndo no meio de tantas feras do automobilismo, mais velhas e mais experientes, como Ciro Cayres e Camilo Christófaro?

Sem dúvida. A coisa chegou a tal ponto que houve uma época em que eu saía em capas de jornais o tempo todo.

Por causa disso, chegou a ser alimentada algum tipo de rivalidade entre você e algum desses pilotos, como a que vimos, por exemplo, entre Ayrton Senna e Nelson Piquet nos anos 80?

Não, não havia. E sobre essa questão entre o Senna e Piquet, a coisa toda estava no caráter de cada um deles. O Piquet era um cara superinvejoso e o Senna já pertencia a uma época mais moderna, movida a milhões e milhões de dólares. O Piquet estava atento a isso. Quando o Senna surgiu, isso apagou um pouco o brilho dele. Na minha época, as dificuldades faziam com que fosse mais difícil acontecer esse tipo de coisa. Os carros não eram iguais, a mecânica era bem diferenciada e você corria cada fim de semana com carros diferentes, em categorias diferentes. Era tudo muito difícil, porque a direção era muito pesada. Eu pilotei um Fórmula-1 em 1972 e senti uma diferença enorme, com tudo macio.

E que carro foi esse?

Foi a Lotus 72 do Emerson Fittipaldi.

E seu acidente em Le Mans? Como aconteceu?

Foi no meio da reta. Meu carro saiu da pista e bateu em uma árvore, completamente de lado. O carro partiu-se ao meio e eu fiquei jogado no meio da pista. Por conta disso, passei oito meses internado no hospital e minha carreira acabou ali.

E o que você fez quando deixou o hospital?

Voltei para o Brasil e vim trabalhar nas empresas do meu pai, uma construtora e uma revendedora de automóveis. Fiquei trabalhando nisso até ele morrer, eu fechar as empresas e me aposentar.

Você nunca mais teve contato com o automobilismo depois disso, profissionalmente falando?

Eu me afastei totalmente das corridas após o acidente. Passei a assistir somente pela TV.

Quais são os pilotos que você mais admirou e como você os compara com os de hoje?

Admirei muito o Emerson Fittipaldi, o primeiro grande piloto brasileiro e precursor de tudo. Ele foi o máximo para mim. Costumo dizer que automobilismo é uma serie de coincidências. Veja o exemplo do Rubens Barrichello, que anda muito, mas nunca teve a sorte de estar na hora certa, no lugar certo, ter o melhor carro. É exatamente o oposto do que aconteceu com o Senna. E eu fico tentando descobrir se o Senna andava mais que o Barrichello. Eu acho que não. Para mim, isso tudo está relacionado às coincidências, enquanto as pessoas chamam de sorte.

Para você, qual é a pista mais desafiadora e o melhor carro?

Sem dúvida alguma, Nürburgring, porque essa era uma pista ameaçadora mesmo. Para correr em uma pista daquelas, com aqueles carros, com pneus fininhos e tão pouca estabilidade, você tinha que ser muito macho. Quanto ao carro, o melhor que conduzi, na minha opinião, foi uma Ferrari, em treinos particulares.

quinta-feira, 19 de março de 2015

Os meninos da Fórmula 1

Nos últimos meses, muito se falou a respeito do jovem Max Verstappen - nascido em Hasselt, na Bélgica, mas naturalizado como holandês -, desde que seu nome foi confirmado como um dos pilotos titulares da Toro Rosso nesta temporada, ao lado do espanhol e também estreante Carlos Sainz. O motivo, como já se sabe, está no fato de ele ser o mais jovem piloto da história da Fórmula 1 a disputar um Grande Prêmio, na Austrália, no último domingo, tendo apenas 17 anos, cinco meses e 15 dias de idade.

O gosto pelas corridas veio naturalmente, tendo origem na própria família, por influência do pai, da mãe, do tio e do avô, todos pilotos. Seu pai, Jos, é um velho conhecido entre os fãs da Fórmula 1, tendo disputado oito temporadas, entre 1994 e 2002, pelas equipes Benetton, Simtek, Footwork, Tyrrell, Stewart, Arrows e Minardi. A mãe, Sophie Kumpen, disputou várias provas de kart. O tio, Anthony Kumpen, correu de FIA GT e também nas 24 Horas de Le Mans, enquanto seu avô, Paul Kumpen, competiu em provas de endurance. Até sua irmã, Victoria, também foi pega pelo bichinho da velocidade e hoje vem despontando em competições de kart.

Talento, Max já provou que tem. Depois de competir no kart desde os quatro anos, o jovem holandês mostrou a que veio no ano passado, quando estreou nos monopostos, competindo na Fórmula 3 Europeia, onde terminou em terceiro no campeonato, com dez vitórias. O maior passo na carreira até agora já foi dado, em meio a muita polêmica e burburinho, em função da pouca idade. Se irá corresponder ao que se espera dele, só o tempo dirá.

Mas na história da Fórmula-1, antes de Max, apenas seis pilotos foram detentores desse recorde em algum momento de suas carreiras. Conheça um pouco da história de cada um deles.

O inglês Geoff Crossley tornou-se o piloto mais jovem a participar de um Grande Prêmio de Fórmula-1, aos 29 anos e dois dias, justamente na corrida que marcou o início da categoria, em 1950. Foi no GP da Inglaterra, disputado em Silverstone. Como antigamente a quantidade de pilotos estreantes a cada temporada era bem maior se comparada aos dias de hoje e, não raro, ocorria a cada etapa, Crossley perdeu seu posto na corrida seguinte, em Mônaco.

Depois disso, disputou apenas o GP da Bélgica daquele ano, onde terminou em nono, a cinco voltas do vencedor da prova. Encarando o automobilismo apenas como diversão, Crossley competiu em mais algumas provas extra-campeonato até 1955, quando decidiu encerrar a carreira nas pistas. A partir daí, dedicou-se à fabricação de móveis até se aposentar, no início dos anos 80. Morreu em 2002, vítima de um derrame cerebral.

Considerado o maior ícone do automobilismo argentino depois de Juan Manuel Fangio, o Rei dos Pampas, José Froilán González tornou-se o piloto mais jovem a correr na Fórmula-1 ao disputar no GP de Mônaco de 1950, aos 27 anos, sete meses e 16 dias, quebrando assim o curtíssimo recorde de Crossley. Sua participação nessa corrida, porém, resumiu-se apenas a uma volta, depois que se envolveu em um acidente que tirou dez carros da prova logo após a largada.

Em 1951, teve a honra de dar à Ferrari sua primeira vitória na categoria, no GP da Inglaterra, onde venceu novamente três anos depois. Deixou o automobilismo em 1960, passando então a se dedicar aos seus negócios na Argentina. Ao longo dos anos, permaneceu idolatrado pelos fãs, com os quais tinha contato em eventos ligados ao automobilismo e também algumas provas da Fórmula-1, para as quais era convidado. Morreu em 2013, de causas não divulgadas.

Em 1950, com a inclusão das 500 Milhas de Indianápolis no calendário da Fórmula-1, Troy Ruttmann passou a ser o mais jovem piloto a disputar uma prova válida para o campeonato mundial, aos 20 anos, dois meses e 19 dias, deixando Froilán González para trás e mantendo o recorde durante 11 anos. Era apenas a terceira etapa do primeiro campeonato da categoria.

Ao vencer a mesma prova em 1952, aos 22 anos, tornou-se também o mais jovem vencedor do evento mais tradicional de Indianápolis, sendo até hoje o detentor desta marca. Encerrou a carreira em 1964. Depois de uma longa batalha contra o alcoolismo e o jogo, morreu em 1997, vítima de câncer no pulmão.

O mexicano Ricardo Rodríguez teve sucesso ainda muito jovem, destacando-se por terminar como segundo colocado as 24 Horas de Le Mans de 1960. A estréia na Fórmula-1 veio no ano seguinte, aos 19 anos, seis meses e 27 dias, quando disputou o GP da Itália, a bordo de uma Ferrari e finalmente bateu o recorde de Ruttman.

Nos treinos mostrou a que veio, qualificando-se na segunda posição no grid. Na corrida, andou sempre entre os três primeiros até abandonar a prova, depois de 13 voltas, com problemas na alimentação do combustível. Morreu precocemente em 1962, aos 20 anos, após um acidente durante os treinos do GP do México, naquela época sem valer pontos para o campeonato.

O neozelandês Mike Thackwell deu seus primeiros passos na Fórmula-1 ao ser contratado como piloto de testes da Tyrrell. Tentou participar do GP da Holanda nesse mesmo ano, substituindo o alemão Jochen Mass na Arrows, mas sem sucesso. A estréia veio no GP do Canadá, aos 19 anos, cinco meses e 29 dias, quando a Tyrrell pôs um terceiro carro na pista. Com a paralização da prova após um acidente na primeira volta, a equipe optou por ceder o carro de Thackwell a Jean-Pierre Jarier na relargada, deixando o piloto neozelandês fora da disputa, mas reconhecido como o mais jovem participante de um Grande Prêmio.

Thackwell só voltaria a largar na Fórmula-1 em 1984, também no Canadá, pela equipe RAM. Abandonou as pistas em 1987, passando a investir em outras carreiras, trabalhando periodicamente como piloto de helicóptero, minerador e professor. Hoje, o único vínculo com o automobilismo vem de sua irmã, Lisa, por ser casada com o piloto australiano David Brabham.


O recorde de Thackwell só seria batido 29 anos depois, quando o espanhol Jaime Alguersuari foi chamado para substituir o francês Sebastién Bourdais a partir do GP da Hungria, com apenas 19 anos, quatro meses e três dias. A reação por causa de sua pouca idade foi a mesma que se viu recentemente com Verstappen, envolvendo jornalistas, blogueiros e outros palpiteiros de plantão.

Na época, houve quem argumentasse que sua contratação era resultado do intenso trabalho de marketing que a Red Bull vinha e continua fazendo no automobilismo, e não exatamente por causa de suas qualidades como piloto. Como se sabe, há anos a marca não mede esforços para associar sua imagem à de jovens pilotos, em alguns casos sendo muito bem-sucedida. Sebastian Vettel é quem melhor exemplifica isso. No total, Alguersuari disputou apenas 48 Grandes Prêmios, todos pela Toro Rosso e com desempenho razoável, dentro do que se espera em uma equipe média. Deixou a Fórmula 1 após a temporada de 2011.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Em Interlagos, a primeira vitória de José Carlos Pace

José Carlos Pace, o inesquecível Môco
Hoje é um dia muito especial para a história do automobilismo brasileiro, especialmente para aqueles que acompanhavam a Fórmula 1 nos anos 70. No dia 26 de janeiro de 1975, há exatos 40 anos, José Carlos Pace, o velho Môco, conquistou sua primeira e única vitória na categoria. E tinha que ser em sua casa, no Autódromo de Interlagos, que, dez anos depois, seria oficialmente batizado com seu nome, em uma justíssima homenagem.

Para a temporada de 1975, a Brabham deu a Pace um novo carro, tendo como base o mesmo modelo do ano anterior, o BT44, criando assim uma versão B, mas com uma série de melhorias, entre elas mudanças estruturais no cockpit, visando à proteção do piloto, a redução do peso total do carro, deixando-o mais próximo dos 575 kg mínimos exigidos pelo regulamento. O objetivo era repetir ou superar os resultados de 1974, em que a equipe obteve um total de três vitórias - todas com o argentino Carlos Reutemann -, uma pole position, seis pódios e 35 pontos no campeonato.

Tudo isso deixou Pace bastante animado. Além do carro modificado e melhorado, outro motivo de comemoração era o contrato de patrocínio recém-fechado com a Martini. E os resultados não demoraram a surgir. Já na etapa de abertura, na Argentina, Pace largou na primeira fila, em segundo, atrás de Jean-Pierre Jarier, da Shadow.

Durante a prova, Pace teve de lutar contra uma incômoda dor nas costelas, causada por um ajuste mal feito no banco do carro, que fazia com que seu corpo se movesse dentro do cockpit durante as curvas. Chegou a liderar por alguns instantes, quando rodou ao passar sobre o pó químico usado para apagar o incêndio no Copersucar de Wilsinho Fittipaldi, caindo para o sétimo lugar. Nas voltas seguintes, Pace foi se recuperando aos poucos, até chegar à quarta posição, atrás de Emerson Fittipaldi (McLaren), James Hunt (Hesketh) e Carlos Reutemann (Brabham), quando teve de abandonar na 49ª volta, com o motor estourado.

Apesar da frustração de não terminar a prova, Pace foi aplaudido de pé pela torcida local, que lhe atribuiu o carinhoso apelido de Pace Corazón, graças ao arrojo mostrado na pista. Nos boxes, foi recebido com festa pela equipe.

Depois da boa atuação em Buenos Aires, Pace passou a ser visto como um dos favoritos à vitória no GP do Brasil, em Interlagos, mas Môco demonstrava ter os pés no chão, quando disse, em entrevista à Folha de S. Paulo: "Vou poder brigar, correr com possibilidade e isso me anima. Sei que tenho que enfrentar o Emerson, o Peterson, o Reutemann, as Ferrari, o Shadow, o Tyrrell e ainda o James Hunt, que está correndo para vencer e tem carro. A corrida é equilibrada e isso torna tudo mais difícil".

Em Interlagos, já livre das dores que o incomodaram na Argentina, Pace também sentia-se bem sob o aspecto psicológico. Nos treinos, classificou-se em sexto, com o tempo de 2min31s58, três posições atrás de seu companheiro de equipe, Carlos Reutemann.

Na largada, Pace tirou bom proveito do carro, ultrapassando as Ferrari de Clay Regazzoni e Niki Lauda ainda na primeira volta, além de Emerson, que largou mal e caiu para a sexta posição. Na quinta volta, Jean-Pierre Jarier era o líder, com Reutemann em segundo. Pace manteve-se em terceiro até a 13ª volta, quando ultrapassou Reutemann no final da Reta Oposta, para delírio da multidão presente em Interlagos.

José Carlos Pace a bordo do Brabham BT44B, tirando proveito das modificações feitas para a temporada de 1975

Na volta 27, o motor da Shadow de Jarier falhou momentaneamente, reduzindo em 12 segundos a diferença em relação a Pace. Atrás deles, vinham Regazzoni, Emerson, Jochen Mass (McLaren) - que vinha fazendo uma excelente corrida, após largar em décimo -, Patrick Depailler (Tyrrell), Lauda e Reutemann. Três voltas depois, Jarier voltou a abrir vantagem, marcando 18 segundos sobre Pace, que por sua vez tinha quase dez segundos de diferença em relação a Emerson Fittipaldi.

A oito voltas para o final, Jarier sucumbiu, parando seu carro logo após a Curva do Sol. O piloto francês sai do carro bastante irritado, chuta um dos pneus e passa o restante da prova tendo de se conformar com o resultado inesperado. Seria sua primeira vitória na Fórmula 1, mas Jarier pagou o preço por exigir demais do carro, mesmo com os insistentes apelos do chefe de equipe, Don Nichols, para que poupasse o equipamento.




A essa altura, Pace seguia como líder, na sua terra e diante de sua torcida. Dez segundos depois, Emerson tentava a todo custo reduzir a diferença, sem sucesso, pois seu carro vinha saindo de traseira a cada curva. Com isso, Pace manteve a liderança, de onde não saiu mais, até a bandeirada final. Emerson terminou em segundo, estabelendo assim a primeira dobradinha brasileira na Fórmula 1, seguido pelo alemão Jochen Mass, seu companheiro na McLaren.



De volta ao pitlane, Pace foi praticamente arrancado de dentro do carro pela torcida em êxtase, que o carregou nos braços. Sabiamente, a polícia não demorou a agir e tratou de levá-lo para os boxes, para que pudesse descansar um pouco e se recompor. Eram outros tempos, em que os rígidos protocolos de hoje ainda não se faziam presentes. Chegando lá, Pace não aguentou. Jogou-se ao chão e desandou a chorar, sendo amparado pela esposa, Elda, e pela mãe, dona Amélia.

Momentos depois, já no pódio, foi abraçado por Emerson, enquanto agitava a bandeira nacional e ouvia a torcida gritar seu nome sem parar. Elda estava ao seu lado, grávida de seu segundo filho, Rodrigo, que nasceria quatro meses depois. Após receber o troféu de vencedor do então prefeito Miguel Colassuono e ouvir o Hino Nacional, Pace ganhou também o abraço de Jochen Mass.

Pace comemora a vitória no pódio, tendo ao seu lado a mulher, Elda, e os pilotos Emerson Fittipaldi e Jochen Mass

De volta aos boxes, durante as entrevistas, Pace repetia e agradecia repetidamente a todos os que confiaram nele até aquele momento, incluindo a torcida brasileira. Um momento que, sem dúvida, ficará guardado para sempre na história do nosso automobilismo.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Entrevista: Bertrand Gachot

Na história da Fórmula 1, existem pilotos que, embora não tenham sido vencedores, sempre tiveram seus nomes gravados na memória dos fãs, pelos mais diversos motivos. Um exemplo bem conhecido é o do chileno Eliseo Salazar, que em 1982 levou uns sopapos de Nélson Piquet após uma tentativa de ultrapassagem mal-sucedida no GP da Alemanha.

Outros, são lembrados por momentos dramáticos, como o italiano Siegfried Stohr, que em 1981 entrou em desespero diante das câmeras, após perceber que tinha atropelado um mecânico de sua própria equipe, a Arrows, na largada do GP da Bélgica. E o que dizer de Eddie Irvine, que estreou arrepiando no Japão, em 1993, dando um chega pra lá em Ayrton Senna, com direito a um soco do tricampeão logo após a corrida?

Pois com Bertrand Jean Louis Gachot foi exatamente assim. Depois de passar maus bocados na Onyx, na Rial e na Coloni em seus primeiros anos na Fórmula 1, ele tinha tudo para ver sua carreira engrenar ao assinar com a Jordan, em 1991. Quis o destino que as coisas não fossem assim quando, na metade daquela temporada, uma briga de trânsito o levou à prisão e, sem querer, o transformou em co-responsável pela estreia antecipada de Michael Schumacher na categoria. Posteriormente, Gachot ainda tentaria a sorte em mais três equipes, todas muito fracas: Larrousse, Venturi e Pacific.

De Schumacher, não há mais nada a dizer. A história está aí para mostrar. Quanto a Gachot, nascido em 23 de dezembro de 1962, vocês verão a seguir um depoimento sincero sobre sua vida, sua carreira, os dias na prisão e tudo o que ele aprendeu durante esse período, nesta entrevista exclusiva que ele me concedeu em novembro de 2010, e que volto a publicar nesta nova fase do Almanaque da Fórmula 1.

Afastado das pistas desde 1997, Gachot virou homem de negócios e dedica-se hoje ao comando de sua empresa, a Hype Energy, uma das principais marcas de bebidas energéticas da Europa. Nas horas vagas, prefere levar a vida em um ritmo mais lento do que quando era piloto, velejando e aproveitando os momentos de lazer com a esposa, Amanda, e os filhos Louis (15 anos), Grace (14) e Lucia (10).

Creio que você seja o único piloto com tripla nacionalidade na história da Fórmula 1. Começou representando Luxemburgo, onde nasceu, passou a usar a cidadania belga e, por último, correu como francês. Por quê?

Embora eu tenha nacionalidade francesa, nasci em Luxemburgo, sendo filho de mãe alemã e pai francês. E estudei na Bélgica. Para mim, a nacionalidade não é importante, é apenas um documento. Jamais vou apoiar uma equipe ou um esportista apenas por ter a mesma nacionalidade que a minha, mas respeito casos expecionais, como acontece em relação ao Ayrton.

Como surgiu seu interesse pelo automobilismo?

Pelo que eu me lembro, sempre gostei do esporte a motor e meu sonho sempre foi pilotar carros. Ninguém na minha família era envolvido com carros ou qualquer outro esporte. Então, certamente fui a ovelha negra.

Onyx ORE-1
Na Onyx, a estreia na Fórmula 1: sonho que virou realidade em 1989  /  © Hans van Onsem (Autosport.be)

Em 1977, quando você começou a correr de kart, quem eram seus herois daquela época?


Eu não tinha muito conhecimento sobre a Fórmula 1 até então. Só tinha visto uma corrida, vencida pelo Emerson. Eu amava a velocidade e a potência desses carros, mas não tinha certeza se possuía as mesmas habilidades daqueles pilotos. Sabia que tinha coragem para correr, mas daí a me tornar um piloto profissional e chegar à Fórmula 1 não passava de um sonho.

Como seus pais reagiram quando souberam você tinha abandonado a universidade para correr na Fórmula Ford 1600, em 1984?

Eles ficaram muito preocupados e tentaram de tudo para que eu parasse de correr. Para citar como exemplo, eles iam me dar um belo carro esportivo só para que eu continuasse estudando e largasse as corridas. Mas eu nunca iria aceitar e eles sabiam disso.

Jean-Pierre van Rossem
Jean-Pierre van Rossem
Em 1989, quando o sonho de correr na Fórmula 1 tornou-se realidade, você assinou com a Onyx, tendo a ajuda do Jean-Pierre van Rossem. Mas foi demitido da equipe antes mesmo do final da temporada. O que aconteceu de fato?

O Van Rossem, que era quem comandava a equipe na época, simplesmente ficou sem dinheiro. O Keke Rosberg já era empresário de pilotos e tinha prometido uma boa grana ao Van Rossem, caso ele desse um carro ao J.J. Lehto. Daí, ele tratou de arrumar um jeito de o Lehto guiar o carro. E eu tinha concordado em deixar a equipe sem dizer nada, pois receberia metade dessa grana. Com ela, eu poderia correr pela Arrows, o que era muito mais emocionante do que continuar na Onyx. Mas os problemas começaram quando o Rosberg deu o calote na equipe.

Em 1991, quando você foi preso em Londres, a imprensa divulgou o caso apenas como o resultado de uma briga de trânsito, sem entrar em detalhes. O que aconteceu exatamente naquele dia entre você e o Eric Court? Por que você usou gás lacrimogêneo nele?

Eu estava junto com o Eddie Jordan, indo para uma reunião com a diretoria da Pepsi. No caminho, tive esse esse incidente com o motorista de táxi. Ele saiu do carro dizendo que ia me matar e me segurou pela gravata. Eu não queria briga, mas usei o gás para me defender. O resto é a história que todos nós já conhecemos.

Meses depois, tive que ir ao tribunal, onde o juiz entendeu que eu exagerei ao me defender e me condenou à prisão, aplicando uma pena que nunca tinha sido dada antes a alguém por uso de gás lacrimogêneo. Ninguém podia acreditar naquela sentença, mas tive que ficar dois meses preso até virem com um recurso para me soltar. Depois disso, tive um encontro com o embaixador da Inglaterra, que me pediu desculpas, em nome do povo britânico, por essa piada em forma de justiça. E estando livre, fui disputar a corrida seguinte, na Austrália.

O que passou pela sua cabeça quando você ouviu a sentença e percebeu que iria para a cadeia, incluindo um período na Penitenciária de Brixton, considerada uma das mais severas da Inglaterra?

Eu não tinha a menor ideia do que isso significava, tanto que já tinha agendado um teste em Ímola para depois da audiência. Antes disso, tinha pedido o conselho de três advogados, que me disseram que o máximo que eu pegaria seria uma pena menor, mas que eu poderia ser multado pelo uso do gás, que era proibido na Inglaterra. Mas na prisão, a primeira noite foi muito emocionante. Eu tinha a certeza de que no dia seguinte estaria solto.

Jordan 191
Bertrand Gachot a bordo da Jordan 191, no GP de Mônaco de 1991

Como sua família e seus amigos reagiram à má notícia?

Eles foram fantásticos. Meu pai assumiu o controle e por isso sou grato por tudo o que ele fez. Os embaixadores da França e da Inglaterra também foram fantásticos. Todos os meus amigos se mobilizaram para me ajudar. Também recebi cerca de dez mil cartas durante meu tempo na prisão, o que me deu uma força tremenda.

Em uma entrevista que você concedeu ao jornalista Joe Saward, em 1991, você disse ter descoberto coisas que nunca acreditou serem possíveis em uma prisão. Como foram seus dias lá?

A prisão era um mundo sobre o qual eu não tinha a menor ideia. Foi uma experiência muito interessante, sob o ponto de vista humano, e encontrei pessoas muito boas lá. Nem todas eram más, mas eu vi coisas lá muito tristes, em que as pessoas perderam sua liberdade e dignidade por causa de situações sobre as quais não tiveram nenhum controle aqui fora. Passei todo esse tempo lendo e aprendendo com as experiências delas. Às vezes, era fascinante. Eu poderia ficar aqui contando essas histórias até de manhã, sobre tudo o que aprendi. E minha conclusão sobre esta aventura é que a prisão não é a solução.

Na Jordan, você teve seu melhor momento na Fórmula 1 e, de repente, tudo acabou. Em algum momento você chegou a pensar que sua carreira tinha chegado ao fim?

Sim, foi uma pena. Naquele ano, eu só tinha vencido as 24 Horas de Le Mans e o carro da Jordan estava indo muito bem. Eu tinha feito a volta mais rápida na Hungria, pouco antes de ser preso, e tinha a certeza de que poderia ter feito a pole em Spa-Francorchamps.

O que você aprendeu de toda essa situação?

Aprendi muito sobre a vida, de modo geral, sobre a injustiça e a felicidade. E decidi que, enquanto minha família estivesse bem e eu estivesse livre, eu seria feliz todos os dias.

Hype EnergyEm 1997, você assinou um contrato com a Hype Energy para distribuir seus produtos na França e, três anos depois, tornou-se o dono da empresa. O que o levou a abandonar as corridas para concentrar sua carreira nesse trabalho, digamos, mais tradicional?

Vejo minha vida em etapas. A primeira foi na época dos estudos, com a escola e a universidade. A segunda foi com as corridas. E a terceira é agora, com minha vida de executivo. Adoro desenvolver a marca Hype. É muito interessante e eu me divirto. Atualmente, vendemos nossos produtos em 40 países, mas estamos diversificando para outros negócios além das bebidas. Para mim, ir para o escritório é emocionante e nunca uma chateação.

Quem são seus amigos na Fórmula 1, entre pilotos, chefes de equipe ou mecânicos?

Tenho muitos amigos na Fórmula 1 e seria difícil citar todos aqui. Tudo o que posso dizer é que, quando vou a um Grande Prêmio, adoro encontrar todos eles, com quem tive bons momentos.

Na sua opinião, qual foi o melhor momento de sua carreira?

Vencer na Fórmula Ford 1600 e na F-Ford 2000. Me senti forte e muito abençoado. Na Fórmula 1, depois de alguns anos andando lá atrás, foi difícil eu me sentir assim novamente. Então, tentei curtir o fato de estar pilotando aqueles carros e procurei tirar o máximo do meu equipamento. Muitas vezes, corri contra mim mesmo. Mas em Le Mans também tive uma grande experiência. Meus companheiros de equipe, Johnny Herbert e Volker Weidler, eram muito bons e fizemos uma ótima corrida. A Mazda, da qual fazíamos parte, chegou a pedir para que fizéssemos tempos que, na verdade, eles nunca esperavam que a gente fosse conseguir.

Mazda 787B
Um dos grandes momentos da carreira: a vitória nas 24 Horas de Le Mans, em 1991, a bordo do Mazda 787B

Do que você sente mais falta de sua vida como piloto?

Da emoção em pilotar esses carros, as amizades e as negociações que envolvem a Fórmula 1, que hoje têm ocorrido cada vez mais rápido.

Para encerrar, uma curiosidade: por que os pilotos nunca cantam o hino de seus países quando sobem ao pódio?

Porque, assim como eu, provavelmente eles também não sabem (risos).