domingo, 15 de maio de 2016

Elio de Angelis: o último gentleman da Fórmula 1

Se tivesse sobrevivido ao acidente que o matou durante testes privados em Paul Ricard, há exatos 30 anos, o italiano Elio de Angelis talvez tivesse a chance de mostrar muito mais do que seu talento permitiu nos sete anos em que correu na Fórmula 1. Quis o destino que não fosse assim.

Embora visto como um piloto regular, que arriscava pouco e, por isso, obtinha resultados medianos, De Angelis é reconhecido até hoje como um dos pilotos mais populares de sua época. Sucesso dentro e fora das pistas, o jovem italiano era elogiado não apenas pela fama entre as mulheres e pelo talento como pianista (não deixem de ver o vídeo no final deste post), mas também por sua extrema simpatia - algo raro no automobilismo do século 21.

Nascido em Roma, no dia 26 de março de 1958, De Angelis vinha de uma abastada família italiana e era o mais velho de quatro irmãos. Seu pai, Giulio, além de bem-sucedido construtor, era também piloto de motonáutica, exercendo forte influência sobre o filho e despertando assim seu gosto pelos esportes.

Apesar da paixão pelo tênis e pelo esqui, não demorou para que Elio percebesse que seu destino estava no automobilismo. A estreia nas pistas ocorreu aos 14 anos, no kart, categoria na qual terminou em segundo lugar no campeonato mundial, em 1975, sagrando-se campeão europeu no ano seguinte. Em 1977, fez a estreia nos monopostos, disputando o campeonato italiano de Fórmula 3, onde venceu em seu primeiro ano na categoria, e também na Fórmula 2.

A Fórmula 1 surgiu rápido em seu caminho, em 1978, com um teste para a equipe Shadow, com a qual assinou o contrato para disputar a temporada seguinte. Aos olhos da imprensa e do público, sua origem abastada mostrava Elio como mais um piloto rico, que só garantiu um lugar na Fórmula 1 graças à generosa ajuda financeira do pai. Pura bobagem. Na pista, Elio revelou-se um piloto extremamente talentoso, capaz de dominar facilmente a complexidade dos carros-asa, presença marcante na categoria naquela época.


Mesmo com sete abandonos na temporada de estreia, somados a uma não-classificação em Mônaco, De Angelis conseguiu o que, para muitos, não passava de um sonho, chamando a atenção do mago da Lotus, Colin Chapman, com quem assinou contrato para disputar a temporada de 1980, ao lado de Mario Andretti.

No time inglês, os bons frutos começaram a aparecer com o segundo lugar em Interlagos, segunda etapa do campeonato. Este resultado o levou a ser incluído no livro dos recordes como o mais jovem piloto a subir em um pódio na Fórmula-1. Tal marca só seria superada 17 anos depois pelo alemão Ralf Schumacher, no GP da Argentina.


A primeira vitória só viria em 1982, no GP da Áustria, onde venceu com apenas cinco décimos de vantagem sobre o finlandês Keke Rosberg, da Williams. Foi também a última vez em que Chapman jogou seu boné preto para o alto, na reta de chegada, comemorando mais uma vitória de sua equipe. O lendário construtor morreria no final daquele ano, em circunstâncias até hoje não esclarecidas.

Elio de Angelis conquista sua primeira vitória no GP da Áustria, em 1982, a bordo da Lotus

A temporada de 1984 foi a melhor de sua carreira, terminando em terceiro na classificação geral, com 34 pontos. Na temporada seguinte, repetiu a dose de bons resultados, chegando a liderar o campeonato durante duas etapas: em San Marino, onde conquistou sua segunda vitória, e em Mônaco. Mas isto não foi o suficiente para pôr um fim à guerra de bastidores na Lotus, da qual Ayrton Senna - seu companheiro de equipe na época - saíra vencedor.

Na posição de segundo piloto, De Angelis encerrara o ano magoado e ressentido com a equipe inglesa, principalmente com Senna e seu chefe de equipe, Peter Warr. Inconformado e sentindo-se traído, assina com a Brabham para substituir Nélson Piquet em 1986, ao lado do compatriota Riccardo Patrese.

Na Brabham, tudo deu errado. O BT55, projetado por Gordon Murray, é considerado até hoje um dos projetos mais fracassados da categoria. Com um chassi extremamente baixo, ele tornava a pilotagem praticamente impossível nas curvas. Mesmo assim, De Angelis fazia questão de testá-lo até o limite, na tentativa de diminuir a diferença em relação aos concorrentes.

De Angelis no GP de San Marino de 1986, a bordo do fraquíssimo Brabham BT55.

Três dias após disputar o GP de Mônaco, onde abandonou na 31ª volta, com problemas no motor, a equipe dava início a mais um teste, no circuito de Paul Ricard, na França, com De Angelis ao volante. Algumas voltas depois, na entrada da curva La Verrerie, o piloto italiano foi surpreendido pela quebra da asa traseira de seu carro. O impacto em alta velocidade fez com que o BT55 se arrastasse sobre um barranco por 80 metros, de cabeça para baixo, até bater em uma árvore e pegar fogo.

Já sem pulso, De Angelis precisou ser reanimado pela equipe médica ainda no local do acidente, antes de ser transferido de helicóptero para o Hospital La Timone, em Marselha, no Sul da França.

O australiano Alan Jones, na época correndo pela Lola, foi o primeiro a chegar ao local do acidente, seguido por Rosberg, Alain Prost e Patrick Tambay. Anos depois, ao lembrar do episódio, Jones deu uma declaração que escancarava a total precariedade no socorro a De Angelis naquele dia.


"Quando cheguei ao local da batida, o incêndio no carro ainda não havia começado. Havia apenas uma ligeira fumaça preta saindo do motor. O problema é que não conseguíamos virar o carro, que era muito pesado. Lembro de ter visto vários fiscais no local, mas com roupas inadequadas. Muitos estavam usando shorts. Para piorar, lançaram todo o pó químico do extintor na direção do cockpit, e não sobre o motor, tornando a situação de De Angelis ainda pior. Foi simplesmente horrível."

Elio de Angelis morreria 29 horas depois, em conseqüência das lesões cerebrais causadas pela violenta desaceleração e dos ferimentos no tórax. Sua morte levou a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) a adotar uma série de medidas de segurança durante os testes e que são usadas até hoje.

De Angelis tornou-se o último piloto a morrer na Fórmula 1 antes da tragédia de Ímola, oito anos depois. Curiosamente, foi justamente Senna quem lhe rendeu o mais significativo comentário durante os funerais do piloto italiano. "Elio era um piloto muito especial, pois tudo o que fez foi por amor ao esporte. Era um cara bem-educado, um cavalheiro, excelente pessoa. Tenho certeza de que não teve culpa no acidente em Paul Ricard, pois nunca ultrapassava seu limite. Jamais brincava com a sorte."

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